Sistema de Ensino

    • A concepção Alemã de ensino

    As faculdades de Filosofia, Ciências e Letras que, nas universidades alemãs, representam o órgão universitário por excelência, integrador das demais atividades e fontes de pesquisas inovadoras, na França não preencheram essa função, situando-se na hierarquia cientifica abaixo das escolas especializadas. Isso verifica-se em vários níveis: nos custos e na duração e na duração maior dos estudos de Direito e de Medicina, por exemplo, em relação aos das faculdades de Letras e Ciências;nas origens sociais dos estudantes, provenientes das classes menos favorecidas, no caso dessas ultimas; e nos salários dos decentes, maiores e mais compensadores no caso das faculdades profissionais (Charle;Verger. 1996, p 78-79).

    Mais uma vez aqui encontramos uma proximidade entre a estrutura da universidade francesa e da URJ, que ao contrário da USP, não possuía uma faculdade de filosofia, ciências e letras nos moldes aproximativos do modelo alemão. A Faculdade Nacional de Filosofia, Ciências e Letras da URJ, instituída pela Lei número 425 de 1937, sempre caracterizou-se pelo enfoque no ensino profissionalizante, sem o desenvolvimento de uma tradição em pesquisa na área de humanidades, não exercendo o papel de órgão integrador por excelência das atividades universitárias.

    O caráter fragmentado e profissionalizante das instituições brasileiras de ensino superior vinha recebendo criticas desde a época imperial, criticas estas que se dirigiram as primeiras universidades criadas no século XX, como a do Rio de Janeiro. Em 1926, Fernando de Azevedo, um dos principais idealizadores da USP, defendia a idéia de integração da instituição universitária, com a ultrapassagem da mera formação profissional e especializada, através da criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL). Ele denunciava a insuficiência das escolas profissionais, meras transmissoras de um saber não superior porque estritamente especializado e comprometido com aplicações imediatas. Defendia um cultivo de um saber livre e desinteressado, capaz de contribuir para o progresso da nacionalidade em formação e para o enriquecimento da educação. Somente uma universidade que cultivasse esses valores poderia ser eficaz na formação das novas elites dirigentes. A FFCL seria o local onde se desenvolveriam os estudos da cultura livre e desinteressada. Ela seria o Locus do curso básico, preparatório para todas as escolas profissionais.

    Dos modelos de universidade instituídos a partir do século XVIII na Europa, o que mais se assemelha a esta concepção de universidade como formadora de elites dirigentes com base na constituição de uma faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como órgão central do Ensino Superior e com consequente ênfase na formação cientifica de cunho humanista, não pragmático, é o modelo alemão.

    A criação da Universidade de Berlim, em 1810, representou um marco fundamental para a concepção moderna de universidade. Foi precedida por uma reflexão teórica da qual fizeram parte filósofos, como Fiche, Shelling e Scheleiermacher e filólogos, como Wolf e Gulhermo de Humboldt, o verdadeiro fundador da universidade de Berlim. Segundo Humboldt, em seus escritos concebe o trabalho cientifico como livre de quaisquer tipos de injunções e pressões como do estado, da igreja e outras demandas externas ao campo acadêmico e universitário.

    Segundo a concepção alemã do século XIX, para que a universidade desempenhe plenamente o seu papel, ela deve ser autônoma, embora sua existência dependa economicamente do Estado. Nesse sentido, num estado que limite a liberdade de ensino e de pesquisa, que impeça a busca e a transmissão incessante da verdade cientifica, não será possível a existência de uma autentica universidade. Ainda segundo esta concepção, existe uma preocupação fundamental com a formação integral e humanista do homem, ao invés da formação meramente profissional, voltada para o mercado de trabalho.

    • – As diferenças entre as concepções francesa e alemã de ensino

    Encontramos acentuadas divergências entre a concepção alemã e francesa de universidade. O modelo alemão enfatiza a importância da pesquisa na universidade, e mais do que isso, da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e formação; ao passo que, no modelo francês, a pesquisa não é tarefa primordial da universidade, havendo dissociação entre universidades, que se dedicam fundamentalmente ao ensino, e “grandes escolas”, voltadas para a pesquisa e formação profissional de alto nível.

    Enquanto o modelo Francês se volta para a formação especializada e profissionalizante, via escolas isoladas: o alemão enfatiza a formação geral, cientifica e humanista, com enfoque na totalidade e universalidade do saber e na consequente importância da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como órgão central da universidade. Enquanto a universidade desde o tempo de Napoleão é mantida e dirigida  pelo Estado, tornando-se uma espécie de aparelho ideológico deste, com pequena autonomia frente aos poderes políticos, a universidade alemã, embora sendo instituição mantida pelo Estado, conservou uma parte notável do seu caráter corporativo e deliberativo, gozando de liberdade de ensino e de pesquisa e de pesquisa, nas suas primeiras décadas de funcionamento, no século XIX. Enquanto a inteligencia francesa possuía um forte vinculo com o Estado, os intelectuais alemães mantinham uma posição de maior independência frente aos poderes políticos.

    Apesar das diferenças existentes entre a concepção francesa e alemã, em ambas houve a preocupação com a afirmação da nacionalidade. No primeiro caso, esta preocupação conduziu a uma visão mais pragmática de universidade, voltada para os problemas econômicos, políticos e sociais emergentes, em um “autoritarismo”. No modelo alemão a preocupação com a constituição da nacionalidade se deu numa chave liberal-elitista, com maior autonomia da universidade diante do estado, desembocando numa concepção mais idealista e acadêmica, e menos pragmática. Estas características podem ser encontradas no discurso e nas propostas dos fundadores da USP (PAULA, 2002b).

    Poderiamos dizer que a URJ teve forte influencia do modelo francês, pois desde sua criação, teve um cunho fundamentalmente profissionalizante, que desenvolveu por décadas, estando muito próxima do estado e mantendo com ele uma relação de cumplicidade; a USP recebeu influencias das concepções francesa e alemã, pois essa universidade nasceu, conjuntamente com a sua faculdade de filosofia, ciências e letras, voltando-se não apenas para o ensino, como também para a pesquisa, e buscando autonomia intelectual diante da igreja e do Estado (PAULA, 2002b).

    O sistema de ensino ele se volta a pesquisa e a produção cientifica. As universidades sob esse sistema quase não existem no Brasil.